28 maio 2013

O lasix

Artigo bem interessante pró lasix que eu li no Site do JCRS e que copiei para cá. Espero que este artigo estimule o debate e que aqueles que defendem a sua abolição, coloquem suas ideias nos comentários.

                            
                                      A HISTÓRIA DO LASIX

A história do Lasix é uma história clássica do horsemen (homem do cavalo) americano. Por muitos anos, os treinadores americanos retiraram o suprimento de água de seus cavalos antes das corridas, acreditando que, com isso, tinham melhor desempenho. Então, quando a furosemida entrou no mercado no final da década de 1960, descobriram que poderiam acentuar o efeito da restrição de água por meio da administração do Lasix. Entre os benefícios, estava a redução na incidência de "sangradores" - em termos técnicos, cavalos com epistaxe, sangramento nasal agudo durante ou após a corrida.

Os sangradores são conhecidos há pelo menos 300 anos; cerca de um por cento dos cavalos sangra pelo nariz durante ou após a corrida. O sangramento está associado à má performance e, em casos raros, à morte do cavalo. Com base na eficácia percebida do Lasix na redução do número de sangradores, o medicamento foi aprovado para uso nos Estados Unidos a partir do início dos anos 1970.

Na década de 1970, surgiu o endoscópio de fibra óptica flexível, e passou-se a realizar a inspeção das vias aéreas (traquéias) de cavalos após a corrida. Descobriu-se, então, que praticamente todos os cavalos puros-sangues apresentavam sangue na traquéia após a corrida. As quantidades variam, de quase indetectável a muito expressiva, incluindo as quantidades associadas a sangramento pelas narinas, ou epistaxe. Além disso, técnicas de lavagem brônquica evidenciaram que todos os cavalos puros-sangues sangram em seus pulmões durante a corrida; a única variável é a quantidade de sangramento. A condição também recebeu um nome novo e mais científico, hemorragia pulmonar induzida pelo exercício (HPIE).

Também se tornou evidente que o dano pulmonar por HPIE é cumulativo e, portanto, conforme os cavalos envelhecem, a incidência de hemorragia aumenta. Cavalos de steeplechase, que tendem a ser mais velhos e sofrer maior impacto por jóqueis mais pesados e saltos, apresentam as maiores taxas de epistaxe. Estudos post mortem em cavalos aposentados devido à EIPH mostram que as lesões pulmonares localizam-se na parte superior dos pulmões, abaixo da espinha dorsal (tecnicamente, nos lobos dorso-caudais), uma localização extremamente específica e incomum. Trabalhos relacionados demonstraram que a pressão arterial pulmonar em cavalos de corrida é mais elevada que o normal, levando à teoria de que a falência por estresse (ruptura) dos vasos capilares pulmonares em decorrência de elevada pressão sanguínea era a causa da HPIE.

Em 1995, Nova York tornou-se um dos últimos estados americanos a aprovar o uso de Lasix. Além disso, as autoridades deste estado monitoraram a incidência de epistaxe em cavalos de corrida que aí competiam antes e depois da introdução do Lasix. Esses dados foram relatados por Bill Heller em seu livro Run Baby Run, publicado em 2002. Os dados mostram que por vários anos antes da introdução do Lasix em Nova York, em setembro de 1995, a taxa de epistaxe, ou HPIE, era de cerca de cinco ocorrências por mês. No entanto, logo após a introdução do Lasix, em setembro de 1995, o número de casos de epistaxe caiu para cerca de um por mês - uma redução de quase 80 por cento -, mantendo-se essa taxa, muito mais baixa, pelos cinco anos seguintes. Estes dados são extremamente contundentes e dão pleno suporte ao argumento sustentado pelos horsemen americanos desde o final dos anos 1960 (e que um de nós, Tom Tobin, apresentou perante Congresso em 1983) sobre a eficácia da furosemida na prevenção de HPIE.

O Jockey Club, no entanto, não ficou convencido e, em 2008, encomendou um estudo apoiado pelo Racing Medication and Testing Consortium (RMTC), pela Fundação de Pesquisa do Jockey Club de Grayson e pelo Jockey Club da África do Sul. Em um estudo muito cuidadosamente concebido e executado, uma equipe internacional de cientistas veterinários chefiada pelo Dr. Ken Hinchcliff demonstrou conclusivamente que a furosemida reduzia significativamente a incidência de HPIE de alto grau, resultado muito semelhante ao que fora observado em Nova Iorque, mais de dez anos antes. Este estudo apoiado pelo Jockey Club foi publicado na Revista da American Veterinary Medical Association, em 2009, estabelecendo inequívoca e cientificamente a eficácia do Lasix na prevenção de HPIE.

A próxima questão que se poderia colocar é como o Lasix atua para reduzir a incidência de HPIE. Há cerca de 20 anos, West, fisiologista pulmonar de humanos, e seus colegas propuseram que a HPIE estaria associada à ruptura dos capilares pulmonares causada pelos níveis de pressão arterial acima do normal observados nos sistemas pulmonares de cavalos de corrida, a teoria de HPIE causada por "falência por estresse dos capilares". Mais recentemente, no entanto, Schroeter, com formação em ciência básica, propôs que a HPIE é causada por ondas de choque associadas ao impacto irradiadas dos membros anteriores. Essas ondas de choque entram nos pulmões, seguem para o "norte" através do tecido pulmonar e são refletidas de volta para o pulmão na superfície superior dos pulmões, onde atuam para romper os delicados tecidos alveolares/capilares. Esta hipótese das ondas de choque oferece uma explicação imediata para a localização incomum das lesões HPIE, no ponto de reflexão na parte superior do pulmão, onde as ondas de choque que viajam para o "norte" são refletidas de volta para o tecido do pulmão.

Corroborando a teoria das ondas de choque, a HPIE não é observada em cavalos que nadam, o que sustenta sugestões de que a HPIE não é causada por exercício, mas pelo impacto. Ainda mais interessante: em cavalos que trabalham em esteira, favorecendo uma mão de apoio, os indícios de HPIE encontrados por meio de técnicas de lavagem brônquica localizam-se apenas no lado do membro de apoio. Aparentemente, o membro de apoio é o membro através do qual as ondas de choque relacionadas ao impacto mais substanciais são transmitidas e, consequentemente, a hemorragia ocorre predominantemente no pulmão do mesmo lado. Além disso, sugerimos respeitosamente que estas observações indicam que o termo Hemorragia Pulmonar Induzida por Exercício pode ser impreciso e que a condição poderia mais corretamente ser chamada de hemorragia pulmonar induzida por "impacto".

Um dos argumentos apresentados por aqueles que desejam a proibição do Lasix é que seu uso "enfraquece a raça." Há pouca literatura científica que sustente esta teoria e muita que a refuta. Primeiro, os cavalos sangram desde os tempos de Eclipse, que às vezes sangrava tão intensamente ao ponto de cair na raia. Uma vez que os genes de Eclipse são predominantes nas linhagens da maioria dos puro-sangue modernos, se quiséssemos produzir animais a partir de pedigrees "livres de sangramento", haveria raríssimos pedigrees dentre os quais escolher. Além disso, o sangramento não é determinado por genética ou hereditariedade, mas é simplesmente resultado da física aplicada. O sangramento ocorre devido a ondas de choque relacionadas ao impacto que atuam sobre os tecidos do pulmão, como demonstra o fato de que todos os cavalos sangram. Ademais, o sangramento está relacionado a ondas de choque na pata de apoio, e fatores físicos como superfície de corrida, velocidade e distância percorrida, peso transportado, número de performances, estado de hidratação, tipo de ferradura, entre outros, provavelmente influenciam no impacto da onda de choque sobre os pulmões do cavalo. Portanto, a Hemorragia Pulmonar Induzida por Exercício é um fenômeno causado pelo impacto e não algo que possa ser evitado simplesmente por meio de manipulação genética.

No que diz respeito ao mecanismo de ação da furosemida, a teoria de HPIE por ondas de choque sugere que o Lasix (ou a privação de água) pode atuar em parte através da redução do conteúdo de água do delicado tecido pulmonar alveolar/capilar, reduzindo, assim, sua suscetibilidade a danos decorrentes das ondas de choque. Esta possibilidade é particularmente intrigante se considerarmos o fato de que a abordagem original à epistaxe foi retirar o suprimento de água dos cavalos, sugerindo que os treinadores americanos estavam corretos desde o início, quando privavam os animais de água antes das carreiras, e também quando, mais recentemente, começaram a administrar furosemida aos cavalos de corrida.

Esse mecanismo de ação do Lasix também pode ajudar a responder à pergunta de por que a furosemida é eficaz na prevenção de HPIE quatro horas após a administração, depois de o medicamento ter sido em grande medida eliminado pelo cavalo. A resposta é agora evidente. Embora a furosemida esteja, para fins práticos, eliminada do corpo do cavalo na hora da corrida, a alteração fundamental no equilíbrio de fluidos do cavalo persiste totalmente até depois da corrida, quando os cavalos voltam a ter livre acesso à água.

Além de reduzir a suscetibilidade do pulmão a danos por ondas de choque, devemos também considerar a probabilidade de que o que chamaremos de pulmão "seco", ou privado de água, seja um pulmão mais eficiente. A este respeito, está bem estabelecido que, se colocarmos muito fluido em um cavalo, sua capacidade pulmonar de oxigenação do sangue é reduzida, provavelmente porque a água adicional no pulmão aumenta a distância que o oxigênio inspirado precisa percorrer do alvéolo até os glóbulos vermelhos do sangue nos capilares pulmonares. Isto é importante porque, na prática, o cavalo é incapaz de oxigenar completamente o sangue em nível máximo de exercício. Assim, qualquer fator que melhore a oxigenação do sangue tem o potencial de otimizar o fornecimento de oxigênio ao sistema músculo-esquelético do cavalo, e, conseqüentemente, seu desempenho atlético.



Isso leva a um possível resultado inesperado no que diz respeito à proibição da furosemida em cavalos de corrida. Isso ocorre porque a proibição do Lasix pode tornar mais fácil levar cavalos ao partidouro "quentes" ou "frios", como se explica a seguir. Neste procedimento, um cavalo "frio" seria um cavalo sem privação de água, ou um cavalo que recebesse fluido adicional com o objetivo de reduzir sua capacidade pulmonar de oxigenação. Por outro lado, um cavalo "quente" seria aquele com privação máxima de água, correndo em condições tão próximas às do uso da furosemida quanto possíveis com a proibição do medicamente. Uma vez que praticamente todos os cavalos hoje correm com furosemida e que o uso da furosemida é muito cuidadosamente regulamentado, o público apostador encontra-se em posição muito melhor para avaliar a capacidade pulmonar e de performance dos cavalos com Lasix do que de cavalos sem Lasix, em que o estado de hidratação do cavalo pode ser manipulado à vontade, sem que haja qualquer teste disponível para verificar tal manipulação.

Por fim, a manipulação de resultados de apostas é imprópria, mas, em última análise, envolve apenas dinheiro. Há, no entanto, outro resultado claro da proibição da furosemida que envolve as vidas de pessoas e equinos. Quando Kentucky instituiu seu primeiro programa de necropsia de rotina para cavalos de corrida, um dos primeiros candidatos a necropsia foi um cavalo que tinha "desabado" na pista cerca de quatrocentos metros depois do partidouro. Na necropsia, descobriu-se que o cavalo tinha duas vértebras fraturadas, mas a necropsia completa definiu a causa da morte como hemorragia pulmonar maciça. Este cavalo foi um caso clássico de morte súbita relacionada a HPIE, em que o cavalo tem sangramento pulmonar grande o suficiente para morrer de forma aguda na pista ou logo após a corrida. Com base nesta experiência, observamos que a definição de HPIE deve ser estendida para incluir a incidência de morte súbita na pista e que estes eventos de morte súbita relacionada a HPIE colocam em risco as vidas de cavalos e jóqueis.

Esse tipo de morte súbita aguda por HPIE foi relatado na Pensilvânia, no Kentucky, em Caracas, no Arizona, no Novo México, entre outros lugares. Com base nos dados relatados por nossos colegas da Pensilvânia, a incidência estimada de morte súbita aguda na pista relacionada a HPIE é de um episódio em cada 1.500 corridas. Como o pré-tratamento com Lasix tem aproximadamente 80 por cento de eficácia na redução da incidência de HPIE de alto grau e epistaxe, não há razão para acreditar que o tratamento prévio com Lasix não reduza em mesma proporção a incidência de mortes agudas associadas a HPIE em cavalos de corrida. Portanto, a administração de furosemida serve para proteger as vidas de cavalos e de seus cavaleiros/jóqueis, gerando circunstâncias éticas fundamentais para veterinários e outras pessoas relacionadas à proteção da saúde e do bem-estar dos cavalos de corrida e daqueles que os montam.

Em resumo, os horsemen americanos haviam observado que a privação de água antes da corrida melhorava o desempenho dos cavalos de corrida e reduzia a incidência de epistaxe. Quando o Lasix injetável foi disponibilizado no mercado, há cerca de 40 anos, eles rápida e corretamente identificaram sua capacidade de prevenir HPIE. Eles fizeram lobby para a sua aprovação no turfe americano, e seu uso se espalhou por toda a América. A ciência agora apoia totalmente sua antiga crença de que o Lasix previne a HPIE e permite que os cavalos corram de forma mais consistente e mais verdadeira. Além disso, a presença do Lasix dificulta a manipulação do desempenho de cavalos pela alteração de seu estado de hidratação antes da corrida. Mais importante ainda, a HPIE/epistaxe está associada a uma pequena incidência de morte súbita em cavalos de corrida, com um risco de ferimentos e morte para cavalos e jóqueis. A revogação da aprovação do Lasix em corridas na América do Norte representará, portanto, um aumento no risco à vida e à integridade física dos cavalos e de seus jóqueis e também aumentará o potencial de manipulação do estado de hidratação de antes das corridas, manipulação para a qual não há procedimentos de verificação disponíveis.



Autores: Dr. Thomas Tobin e Dr. Kimberly Brewer

Traduzido por Flávia Westphalen

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