08 abril 2009

José de Alencar

 Reproduzo parte de uma crônica de José de Alencar, publicada no Correio Mercantil em 1855. Vale a pena ver como o autor,  há mais de 150 anos atrás, já dava idéias para popularizar o turfe e como este  era tratado de forma amadora . Depois de tanto tempo, penso que esta batalha, profissionalismo e popularização, não seja assunto para se resolver em séculos, com sorte em um milênio...

"Rio, 24 de setembro
      Domingo passado o caminho de São Cristóvão rivalizava com os
aristocráticos passeios da Glória, do Botafogo e São Clemente, no luxo e na
concorrência, na animação e até na poeira. O Jockey Club anunciara a sua
primeira corrida; e, apesar dos bilhetes amarelos, dos erros tipográficos e
do silêncio dos jornais, a sociedade elegante se esforçou em responder à
amabilidade do convite.
      Fazia uma bela manhã: - céu azul, sol brilhante, viração fresca, ar
puro e sereno. O dia estava soberbo. Ao longe o campo corria entre a
sombra das árvores e o verde dos montes; e as brisas da terra vinham
impregnadas da deliciosa fragrância das relvas e das folhas, que predispõe
o espírito para as emoções plácidas e serenas.
      Desde sete horas da manhã começaram a passar as elegantes
carruagens, e os grupos dos gentlemen riders, cavaleiros por gosto ou por
economia. Após o cupê aristocrático tirado pela brilhante parelha de cavalos
do Cabo, vinha a trote curto o cabriolé da praça puxado pelos dois burrinhos
clássicos, os quais, apesar do nome, davam nesta ocasião a mais alta prova
de sabedoria, mostrando que compreendiam toda a força daquele provérbio
inventado por algum romano preguiçoso: Festina lente.
      Tudo isso lutando de entusiasmo e ligeireza, turbilhonando entre
nuvens de pó, animando-se com a excitação da carreira, formava uma
confusão magnífica; e passava no meio dos estalos dos chicotes, dos gritos
dos cocheiros, do rodar das carruagens, e do rir e vozear dos cavaleiros  como uma espécie de sabat de feiticeiras, a começar no campo de Sant’Anna e a perder-se por baixo da sombra de meia dúzia de árvores do Prado e das tábuas sujas e carcomidas de uma barraca que por capricho chamam pavilhão, e que de velha já se está rindo das misérias do mundo.
      Às 10 horas abriu-se a raia (turf), e começou a corrida com a
irregularidade do costume. Os parelheiros pouco adestrados, sem o ensino
conveniente, não partiram ao sinal e ao mesmo tempo, e disto resultou que
muitas vezes o prêmio da vitória não coube ao jóquei que montava o
melhor corredor, e sim àquele que tinha a felicidade de ser o primeiro a
lançar-se na raia. A última corrida, que durou um minuto e dezenove
segundos, teria sido brilhante se dois dos cavalos não se tivessem lembrado
de imitar as pombinhas de Vênus, que dizem, voavam presas por um laço
de amor.
      A diretoria, que envidou todos os seus esforços para tornar agradáveis
as novas corridas, deve tomar as providências necessárias a fim de fazer
cessar estes inconvenientes, formulando com o auxílio dos entendidos um
regulamento severo do turf. Convém substituir o sinal da partida por outro
mais forte e mais preciso, e só admitir à inscrição, cavalos parelheiros já
habituados à raia.
      Seria também para desejar que se tratasse de melhorar a quadra
(sport) com as inovações necessárias para comodidade dos espectadores; e
que desse alguma atenção à parte cômica do divertimento. Instituindo-se
corridas de burrinhos e de pequiras. Nós ganhávamos com isto uma boa
meia hora de rir franco e alegre, e estou certo que por esta maneira o gosto
dos passatempos hípicos se iria popularizando."

4 comentários:

  1. o blog chega disco esculacha e fala a verdade sobre o jcb e tudo que acontece

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  2. Antonio Lafayette Salles8 de abril de 2009 às 18:06

    Aron,
    excelente cronica!

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  3. MARIKKA,SEM os inconvenientes sapatos de ferro,por um capricho do destino,não vence o pa´reo,pois correu em seu selvagem estado,sem a invenção dos terráqueos,,,as outras tinham melhor background...apesar de anglicismo,essa palavra me agrada para designar as outras potrancas,bem mais cotadas para vencer.CARO ARON,POR QUE INSISTEM TANTO EM FERRAGEAMENTO EM PISTA DE GRAMA??VIVA JOSE´ DE ALENCAR!!GUSTAVO BOGOLJUBOW

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  4. Você continua a merecer meu apreço, que aumenta cada dia que passa. Além de boas indicações, com veracidade de comentários, você trabalha para o crescimento do turfe, buscando fatos, notas, músicas e filmes sobre o esporte dos reis.
    Essa publicação sobre José de Alencar é um ótimo exemplo.
    Parabéns!
    Miranda Neto

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