04 julho 2020

O gênio das rédeas




Este post é uma homenagem póstuma a  Albênzio Barroso, que foi para mim, o melhor largador que pude presenciar ao longo de minha vida como turfista. Não me refiro a jóqueis ligeiros, no que ele também foi um dos maiores, mas sim aqueles dois ou três primeiros galões depois do larga. Não, senhores, não era uma percepção o que o homem tinha, era quase uma clarividência. A mão do Barroso era o dedo do starter, acionados na mais perfeita sincronia, e dada a partida, dificilmente não era seu pilotado que aparecia na frente. Esse dom da percepção, não só na partida mas também em todo o percurso, é o que distingue uma imensa legião de jóqueis bons, dos verdadeiros gênios das rédeas. Um dom que é privilégio de poucos, muito poucos.

Relatarei aqui duas pequenas histórias que me foram passadas, não sei por quem, não sei aonde, já que  Barroso, mesmo  que afastado das pistas, por aproximadamente duas décadas, é sempre lembrado em qualquer conversa que remetam a corridas memoráveis  que houve principalmente no Hipódromo de Cidade Jardim, local de seus maiores feitos .

A primeira delas tem como coadjuvante o craque Meu Gaucho, criação e propriedade do saudoso Haras Rosa Do Sul. Era o final de Maio de 1989. O palco, a majestosa grama do Hipódromo da Gávea.

O staff estava preocupado, pois se aproximava a hora do páreo e nada do fabuloso jóquei comparecer para o compromisso de montaria. A substituição por um ginete carioca parecia certa, pois, embora tendo havido tolerância por parte da Comissão de Turfe, Barroso não chegava. Mas chegou!! Todo estropiado, manquitola, cheio de arranhaduras e esparadrapos pelo corpo e pedindo para montar. Na viagem de automóvel de São Paulo ao Rio, o piloto sofrera um acidente, saiu do hospital direto para o hipódromo. Comissão de Corridas reunida, monta ou não monta, deixaram montar, dizem as más línguas, para facilitar a vitória de um representante do turfe carioca, já que as condições físicas de Barroso eram aparentemente péssimas.

A corrida não lembro bem do desenrolar, mas na frente, como era  costume,  Meu Gaucho/Barroso. Aquele filme mil vezes visto, pic-pic, pic-pic, um corpo com luz, entra na curva e dá uma alça, e lá vem a tropa se aproximando. Iniciam a reta, o grande jóquei, talvez por causa do acidente, se fingindo de morto, vem um e não passa, vem outro e já cansou, lá vem o Ricardinho em cima da espada dos cariocas, Ego Trip, do Santa Ana do Rio Grande. Ernani Pires Ferreira diz que vai passar, mas aquele que  fingia, agora mostra que está vivo, troca o chicote de mão e faz o potro render, mais são do que o melhor atleta no apogeu de sua forma, e desdiz o grande locutor, Até o monstro Jorge Ricardo sabia, botar do lado é fácil, passar é que são elas. Uma direção sensacional, uma das maiores do "Feiticeiro".









A outra história. Tinha um potro de 2 anos inédito, também do Rosa Do Sul, o nome era A Good Reason. Nos trabalhos para a seletiva da IV Copa de Velocidade da ANPC, Barrosinho salta do animal e diz, "esse é melhor cavalo que montei na vida". Para um ginete que tinha montado grandes cavalos, como  Kenetico e Off The Way, pareceu um disparate, afinal o bicho nem tinha estreado ainda. Pois bem, na Seletiva, A Good Reason pulverizou o Record dos 1100 areia de Cidade Jardim, uma vitória por larga margem que deixou a todos no hipódromo estupefactos. Pena que o vaticínio  do jóquei não pode ser confrontado, já que A Good Reason quebrou o joelho nesta prova e nunca mais correu,

E assim foi Barroso, aquele que antevia craques,que enfeitiçava os cavalos e, também, porque não dizer, os senhores starters. Descanse em paz, Feiticeiro.
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