Por Olavo Rosa/Aron Correa
Vamos falar de Grande Prêmio São Paulo, uma vez que a data de sua realização na sua versão 2012 se aproxima.
O primeiro GP São Paulo foi vencido por Mehemet Ali em 1923, ainda na Mooca e nesse hipódromo tivemos dezessete edições, até 1939. O único ano em que a prova não foi realizada foi o de 1940. Em Janeiro de 41 inaugura-se o Hipódromo de Cidade Jardim e desde aquela época até hoje o nobre espetáculo é realizado na pista de grama , às margens do Rio Pinheiros.
Nosso foco, nessa primeira série sobre o tema, será o São Paulo de 1946, o primeiro do Pós-Guerra. Seguramente o GP mais polêmico da história. Incríveis acontecimentos antes, durante e depois da carreira ratificam esta afirmação: tudo começou com um número inexpressivo de inscritos (oito). O motivo? A presença garantida nesta lista, do argentino Secreto, um Cocles em Seine, cavalo que gozava de amplo cartaz na época e que era tido como verdadeira pule de dez. Secreto havia corrido o GP Brasil do ano anterior e ousara travar duelo em toda reta de chegada com a lenda Filón, outro cavalo argentino que teve em seu dorso, nesta prova, o não menos lendário maestro Irineo Leguisamo. Filon já tinha ganho um Pellegrini anteriormente, mas venceu a prova por menos de meio corpo, em reta extremamente disputada, como comprova a foto abaixo:
Filón resiste a Secreto |
Nesta outra imagem, o Convite do GP São Paulo, publicado nos principais jornais. Notem que temos os nomes dos parelheiros que alinhariam na prova máxima do turfe paulista e a bolsa para os vencedores (300 mil cruzeiros):
Convite para o GP São Paulo de 1946 |
Quis o destino, porém, que chovesse sem parar nos dias que antecederam a carreira. A raia de grama, encharcada e até com poças, ficou completamente impraticável.
Aqui cabe um parêntese: Secreto tinha ganho as duas principais provas do turfe gaúcho ( Bento e Protetora) na propriedade do Sr. Naio Lopes de Almeida. Correra o Brasil de 1945, no nome do múltiplo ministro do Governo Vargas, Oswaldo Aranha, grande apreciador das corridas , e aparecia neste GP São Paulo como propriedade dos irmãos Grimaldi Seabra (Roberto e Nelson). Os irmãos Seabra, nas décadas de 50 e 60 vieram a ser o sinônimo do fortalecimento da criação nacional do PSI.
No domingo de 6 de Abril, pela manhã, Roberto e Nelson, temendo pelo perigo de expor seus pupilos a um acidente (Secreto tinha um faixa, Cumelen), mandaram a Comissão de Corridas afixar forfaits dos mesmos. Ora, isso significaria um páreo de seis cavalos e sem sua maior estrela. A Comissão de Corridas solicitou aos proprietários para que os animais corressem a prova, colaborando com a grandeza do evento. As negociações não chegaram a um acordo pacífico, com muitas acusações e troca de desaforos e, até perto do horário de largada da prova, não sabia-se ao certo se Secreto correria ou não. Por fim, a parelha entrou na pista para o cânter. O que ninguém sabia até aquele momento era que já havia ordem dos Seabra para os jóqueis da parelha: “larguem, corram em último, tudo bem por fora, e cheguem em último”.
E assim foi. Ganhou Miron , de José Paulino Nogueira, com o Pierre Vaz fazendo posição. Secreto era levado de barbada, mas se tivesse corrido para valer, teria que suplantar este filho de Cartagines, pois o mesmo provou ser de corrida, levando também o GP Brasil daquele ano. A parelha chegou último e penúltimo, a perder de vista. A vaia logo após o páreo foi descomunal. Secreto não tinha uma mancha de barro, a ordem fora cumprida com rigor, correra sempre pela cerca externa. O estado lastimável da raia se poderia medir pelo tempo daa prova. O tempo foi de3m36’2 para 3200m, o record era 3m20’0, a diferença de 16 segundos equivale a 250m.
Chegada do GP São Paulo |
Foi um tremendo desrespeito ao apostador, uma briga de egos, uma demonstração de imperícia, a prova tinha que ser transferida para a areia, mas não o fizeram para preservar a tradição; a segurança e o respeito ao apostador, ficam para depois (o pior é que esse depois não chega nunca).
O jóquei, D.“Minguinho” Ferreira foi suspenso por 90 dias, mas continuou montando para os Seabra, até ganhou o GP Brasil em 50, com a mais famosa de todas as éguas, Tirolesa.
A repercussão nos meios de comunicação foi das maiores, tanto que dez dias depois da corrida ainda havia embate entre a Comissão de Corridas e a tropa de choque dos Seabra. Vejam declaração ofical desta Comissão, publicada a 15 de Abril, na Folha de São Paulo:
Declaração da C.C do JCSP |
Diante de tal quadro, a família Seabra houve por bem retrucar e em um A Pedidos, escrito por ninguém menos do que o já citado e poderoso Oswaldo Aranha, bate no comissariado, digamos que com uma luva bem mais potente do que a de pelica. Tirem suas conclusões:
A Pedidos de Oswaldo Aranha |
Ficou para a história a maior puxe de todos os tempos, que de secreto não teve nada, declarado e absurdo. Os Seabra ficaram de relações cortadas com o JCSP por cinco anos, até que resolveram voltar, em 1951, como se nada tivesse acontecido.Teria sido este GP, o começo da guerra de egos inflados que prejudica o nosso turfe até os dias atuais?